Continuação...
Médicos planejam testes em dez pessoas
Há um ano e meio pesquisadores do Hospital Israelita Albert Einstein, da USP de
Ribeirão Preto e da Unifesp estudam formas de tratar a ELA. O objetivo da
pesquisa é realizar, em caráter experimental, o transplante de medula em dez
pacientes com a doença ainda em fase inicial. Por se tratar de algo que ainda não tem comprovação científica da eficácia e
segurança, os pesquisadores dependem de autorização do Ministério da Saúde.
O hematologista do Albert Einstein Nelson Hamerschlak, um dos integrantes da
pesquisa, disse que o primeiro relatório sobre a possibilidade de realização da
cirurgia de células-tronco nesses pacientes já está sob análise do comitê de
ética do hospital. Essa avaliação pode demorar até 60 dias. Só depois de receber essa aprovação é
que o pedido poderá ser encaminhado para o Conselho Nacional de Ética em
Pesquisa, do Ministério da Saúde.
O pedido de aprovação da pesquisa no Conep também pode levar alguns meses. O
órgão tem 60 dias para se manifestar, mas pode pedir prorrogação do prazo se
considerar que a pesquisa ainda precisa de mais dados. Caso o pedido de pesquisa seja aprovado pelo órgão, os hospitais estarão
autorizados a realizar a primeira fase do transplante experimental em dez
pacientes: cinco de São Paulo e cinco de Ribeirão Preto. A seleção dessas
pessoas ficará sob responsabilidade da Abrela (Associação Brasileira de
Esclerose Lateral Amiotrófica).
Hamerschlak acrescentou que, se ficar comprovada a eficácia do transplante
nesses dez pacientes com doenças neurológicas, outros 50 serão chamados para a
segunda fase do estudo. A mesma técnica experimental está aprovada há cerca de um ano nos Estados
Unidos. A Baylor University, em Houston, já realizou pelo menos sete
transplantes de células-tronco em pacientes com doenças neurológicas. A única diferença, segundo Hamerschlak, é que eles fizeram o transplante com
células-tronco alogênicas (com doador). Alguns pacientes morreram, mas ainda
não há conclusões. Outro grupo de pesquisadores, de Chicago, também está trabalhando para
conseguir aprovar a pesquisa na mesma linha.
O banqueiro e o professor Isaac Miguel do Nascimento (paciente de Ribeirão),
que participaram do transplante experimental, não serão considerados
integrantes da pesquisa porque ela não está aprovada pelos comitês de ética. Hamerschlak acrescenta, no entanto, que o banqueiro foi informado sobre o
andamento do protocolo de pesquisa. "Ele soube, inclusive, dos riscos do
tratamento, uma vez que o mesmo inclui quimioterapia de altas doses,
possibilitando infecções e com risco de morte", diz. Ainda segundo Hamerschlak, o paciente também soube que o projeto da pesquisa
ainda estava em andamento e, por isso, não seria possível afirmar se o
transplante trará benefícios reais. "A principal dúvida que existe em realizar transplante de células-tronco
para doenças neurológicas é saber se essas células têm capacidade de migrar para
outras regiões do corpo, como nervos, músculos e neurônios", destacou.
O neurologista Acary Souza Bulle Oliveira diz ainda que um insucesso nessa
cirurgia poderá paralisar todos os processos de estudo sobre a doença. "A
ciência é muito complicada. Essa situação é muito espinhosa porque partimos de
suposições." Hamerschlak concorda, mas faz uma ressalva: "Eu não estaria trabalhando
nesse projeto há um ano e meio se não acreditasse nos resultados. Mas tenho de
provar que o transplante é eficiente. O nosso protocolo ainda está em análise.
Pode ser que não seja aprovado. Não quero criar ilusões nos outros
pacientes."
Pesquisa com humanos exige aval de conselho
O primeiro critério para aprovação de uma pesquisa experimental com seres
humanos é avaliar se já existem evidências científicas da eficácia e segurança
suficiente para as pessoas envolvidas, já que existe a possibilidade de riscos. A afirmação é da secretária-executiva do Conselho Nacional de Ética em
Pesquisas, órgão ligado ao Ministério da Saúde, Corina Bontempo de Freitas.
"É necessário avaliar os riscos, os benefícios e os resultados",
afirma Corina. Segundo ela, o conselho ainda não recebeu nenhum pedido de análise para
autorizar as pesquisas envolvendo transplantes de células-tronco em pacientes
com ELA (esclerose lateral amiotrófica), doença que atacou o banqueiro paulista
que entrou na Justiça para realizar a operação. "Não sabíamos nem da decisão judicial. Espero que esse seja um caso
excepcional porque os hospitais não podem continuar fazendo esse procedimento
sem passar pela nossa análise. Esse tipo de experiência ainda depende de nossa
aprovação", alertou Corina.
Esclerose múltipla
Ainda segundo Corina, já existem pedidos de pesquisa aprovados para realização
de transplante de células-tronco autólogas para tratamento de esclerose
múltipla, e não da esclerose amiotrófica. Depois que um pedido de avaliação dá entrada no conselho, o órgão tem 60 dias
para emitir um parecer. Há casos em que o prazo pode se estender porque os conselheiros entendem que
são necessários alguns ajustes ou solicitam consultorias com outros
especialistas da área envolvida no processo. Existem cerca de 450 comitês de ética em pesquisa espalhados pelo Brasil
-funcionam em hospitais e universidades. Todo projeto que envolve pesquisa com seres humanos precisa passar por
avaliação nos comitês locais e, em casos especiais, como novos procedimentos e
tratamentos de saúde, é necessário que eles passem pela análise e sejam
aprovados pelo Conep. (Fernanda Bassette)
(Folha de SP, 18/9)
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